Anotações sobre o Patrimônio Urbano...
Em seis conferências realizadas acerca
do Patrimônio Urbano foram discutidas competências administrativas,
participação da sociedade civil, panorama histórico do Patrimônio Cultural na
cidade de Évora e perspectivas para os próximos anos; os debates foram mediados
por especialistas nas mais diversas áreas, agentes administrativos e membros do
Grupo Pró-Évora.
A partir do tema central: Patrimônio
Urbano, as conferências trouxeram vislumbres de como nos tempos atuais tem sido
gerido e percebido as questões relativas ao Patrimônio Cultural de forma geral,
quer seja pelas autoridades políticas, quer seja pela população. A cidade de
Évora, Patrimônio Cultural da Humanidade, permeou todo o ciclo de conferências
e como a arquitetura religiosa é marcante diante as outras construções (como
mostra a figura seguir) tratamos
incialmente aqui dos aspectos do patrimônio arquitetônico de matriz cristã.
A arquiteta Estela Safara Cameirão
abriu o ciclo de conferências elucidando aspectos teóricos daquilo que venha a
ser considerada arquitetura religiosa. A partir de seus comentários
identificamos arquitetura de matriz cristã como uma das possibilidades de
arquitetura religiosa, sendo ainda possível falar de patrimônio arquitetônico
litúrgico. Este tipo de arquitetura pode possuir, dependendo do ponto de vista
usado, valor artístico, social, cultural, histórico ou espiritual; ou todos
eles juntos. O espaço litúrgico é também espaço sagrado, essas expressões
litúrgicas e arquitetônicas são elaboradas a partir de uma ideia: a forma deve
ser construída em favor da função, isto é, todo edifício religioso tem como
pressuposto a relação homem x Deus, deste modo a forma traduz a maneira de uma
época de se relacionar com Deus.
Apesar do caráter primordial de se
relacionar com Deus se manter inalterável, a forma vai mudando no decurso da
experiência cristã. Disto advém a importância de preservar o patrimônio
litúrgico, tendo em vista que de acordo a época em que foi construído contém
singularidades em imenso, quer seja na maneira como foi edificado, no seu
patrimônio integrado ou ainda na maneira como se pensava a relação com Deus em
um dado momento histórico.
A arquiteta salientou que caso já não
seja possível manter o edifício religioso com a função de culto, a Igreja
Católica admite readaptações de uso, desde que não seja profanador do espaço
sagrado, como o uso para recitais de poesia, museus de arte sacra, concertos de
música clássica, etc. na cidade de Évora foram dados dois exemplos, o primeiro
de aspecto positivo, a reabilitação da Igreja do Salvador (figura
a seguir) empreendida
pela Arquidiocese de Évora que tornará aquele local em um centro cultural, e
outra de aspecto negativo, o uso da Igreja de São Vicente, igreja desafeta,
propriedade da Câmara Municipal de Évora, que já em muito perdeu suas
características originais.
Ao andarmos por Évora cotidianamente
percebemos quanto a Igreja Católica marca profundamente a paisagem da cidade,
Évora contém dezenas de igrejas e conventos construídos em diferentes épocas
(da época medieval aos nossos dias) que exemplificam a discussão das formas da
relação com Deus nos mais variados tempos, já citado nos parágrafos acima.
Percebemos isso quando consultamos a lista dos primeiros edifícios
classificados na cidade divulgados no Diário do Governo de 16 de junho de 1910:
Sé de Évora, Ermida de São Brás, Igreja da Cartuxa, Igreja da Graça, Igreja de
São Francisco, Igreja dos Lóios.
Assim, na conferência promovida pelo
grupo Pró-Évora através de seu presidente Celestino Fróis David, ao falar sobre
o grupo fundado em 1919, sendo a primeira associação civil em defesa do
patrimônio em Portugal. A atividade do grupo foi proeminente para atual
delimitação do Centro Histórico de Évora, sobretudo dos edifícios religiosos e
das muralhas que circundam a cidade. No conjunto de fotografias expostas pelo
Celestino Fróis David ficaram evidenciados os traços das igrejas nas diversas
paisagens da cidade de Évora. Somando-se aos edifícios religiosos já
classificados na primeira lista nacional de Monumentos, através da ação do
grupo Pró-Évora fora acrescentados a esta lista os seguintes imóveis de matriz
cristã: Convento de São Bento de Cástris, Convento do Calvário, Igreja do
Convento de Santa Clara e torre sineira do Convento do Salvador.
Para além do patrimônio de matriz
cristã, Celestino Fróis David relatou o que é considerada a maior vitória do
Grupo Pró-Évora, que foi a classificação como Monumento Nacional de parte dos prédios
militares que constam das antigas muralhas, portas extremas e da Porta da Lagoa
e do Raimundo, proposta pelo grupo, a fim de impedir a venda pela Câmara
Municipal para a construção de edificações de habitação. Com a ação do grupo,
ficou preservada não só as edificações em si, mas paisagem daqueles que chegam
via Lisboa a Évora, com a chamada cerca Fernandina (figura
a seguir) preservada.
Extrapolando a discussão dos imóveis
classificados de caráter cristão, as duas conferências realizadas por membros
da Câmara de Évora foram muito importante tendo em vista que proporcionou ter
uma visão ampliada do conjunto patrimonial da cidade. Segunda a Câmara, existem
hoje listados 2407 imóveis com valor patrimonial em todo centro histórico. As
primeiras transformações se iniciaram na segunda metade do século XIX com a
desobstrução do Templo Romano. Após as primeiras classificações, em 1937 entrou
em vigor o Regulamento Geral da Construção Urbana da Cidade Intramuros, deste
regulamento até a década de 1970 foram realizadas intervenções e restauro nos
principais monumentos. Na década de 1980
realizaram-se recuperações no Centro Histórico, que já possuía mais de trinta
imóveis classificados e que culminou na candidatura e aprovação da cidade como
Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO em 1986.
Atualmente, segundo os técnicos da
Câmara, cabe ao município a respeito do Patrimônio Cultural a ordenação do
território, a urbanização e edificação, gestão direta do patrimônio cultural,
atribuição das leis de bases do patrimônio cultural. Nomeadamente através de
documentos como o PDME (Plano Diretor do Município de Évora), PUE (Plano de
Urbanização de Évora), PGCHE (Plano de Gestão do Centro Histórico de
Évora).
Alguns temas foram prejudicados diante
o tempo diminuído diante do grande volume de informação a ser transmitido,
porém com as conferências podemos confrontar as atividades administrativas
publicas ou da sociedade civil com os debates sobre a nova cidade europeia
contidas na Carta de Atenas. Uma cidade é feita para ser confortável para seus
habitantes e deve ter harmonia em suas atividades e ser igualmente competitiva,
vemos Évora como uma cidade marcada pela arquitetura religiosa e que deveria
explorar mais este seu traço característico. Além dos imóveis de matriz cristã
classificados foram acrescentados posteriormente a Igreja do Senhor Jesus da
Pobreza, a Ermida de São Miguel, Palácio da Inquisição, a Igreja de Santo
Antão, a Igreja de São Vicente, Igreja da Misericórdia e Igreja das Mercês. (Apesar
desta discriminação dos imóveis classificados, o Centro Histórico de Évora ao
ser classificado como Patrimônio da Humanidade contempla todos imóveis e lugares
existente em seu interior).
*Além
das Conferências, foram utilizados os seguintes documentos como referência:
Carta
de Atenas (2003)
Convenção
para a Conservação do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural (UNESCO 1975)
Marcadores: Cidades e Urbanismo, Évora, Portugal
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