Porque Tudo Muda...

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Qualquer lugar não é o seu...


Já fazia dezoito anos que ele tinha feito sua primeira viagem. Um russo de meia idade, cabelos grisalhos e mãos marcadas pelo trabalho no campo (da época em que morava na extinta URSS). Foi justamente sair da URSS a sua primeira viagem, como destino partiu para os Estados Unidos da América (lugar comum para aqueles que procuram construir uma nova vida noutro país). Ao desembarcar na América sentiu pela primeira vez o que é ser um estrangeiro viajante, seus 1,97m de altura e pouco mais de 90 kg associados aos cabelos louros eram logo notados, características que faziam todos a sua volta a observá-lo como um diferente. Após fixar residência, conseguiu um bom emprego em um jornal e se tornou um desses russos com sucesso que foram morar nos EUA.
Depois de quase duas décadas de sua primeira viagem, ele agora ficava horas a pensar nas suas aprendizagens em tantos lugares por onde já havia passado em sua carreira de jornalista. Sentado muitas vezes em sua poltrona no seu apartamento, espreitava a paisagem vista de sua janela, no 40º andar, e refletia como os estrangeiros são sempre parcialmente aceitáveis em outras terras, talvez por isso ele se identificasse tanto com o inverno; após tantos anos, permanecia solitário e indiferente às muitas situações por ele vividas, com exceção de algumas poucas, como em uma viagem que fez ao Brasil.
Há não mais que cinco anos, ele foi a Bahia, num período que é menos comum visitar o Brasil, o inverno. Diferentemente do inverno norte-americano, no nordeste brasileiro as temperaturas atingem mínimas de apenas 14 graus nesta época. Deste modo, ele se sentiu a vontade (mesmo que todos em volta estivessem com bastante frio), e participou de umas das festas mais típicas do Brasil, que é o São João. De certa forma, muita coisa parecia estranha a ele, mas como já tinha aprendido o português razoavelmente, ele conversava com as pessoas, bebia licor, comia os pratos típicos da festa: canjica, bolo de aipim, de tapioca, de puba, etc. e até tentou dançar forró, música tradicionalmente nordestina e foi numa das letras de uma das músicas que tocava que o tornou reflexivo acerca de toda a sua vida: “quem foge a terra natal noutros cantos não para”.
Mesmo depois de voltar aos Estados Unidos, este verso ficava a se repetir em sua cabeça, pois era verdade que ainda que tenha tido sucesso na América, nunca mais ele havia repousado em um lugar que lhe parecesse seu.
Passados esses anos da viagem ao Brasil, ele passou a ter uma vontade crescente de retornar as margens do Lago Ladoga, lugar de sua infância e consequentemente lugar constituinte de seu ser. Ele imaginava sentir de novo o cheiro de algas geladas e suas cores verde-azuladas e o quão isso o deixava feliz, não por ter tido uma das infâncias mais felizes da Rússia soviética, talvez feliz por ser aquele o seu lugar.

Crédito da imagem: World for Travel



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sexta-feira, 16 de novembro de 2012

O Outro, um conflito...


E a partir de então aqueles dois mundos não mais se distanciaram...
O período de chuvas já havia passado, pairava sobre a costa um clima mais ameno, entretanto bastante úmido (como é comum em áreas de floresta), Ubiraci e seus amigos trabalhavam em um conserto de equipamentos deteriorados devido à última tempestade quando avistaram uma enorme construção no horizonte marítimo. Espantaram-se, seus olhos nunca tinham visto nada igual; à medida que se aproximava, aquele objeto estranho adquiria em sua mente um caráter monstruoso e mítico.
Pedro parecia enfim ter chegado a um de seus destinos após meses no mar enfrentando tempestades, lutando contra doenças, com falta de água e alimentos. Ele e sua tripulação, ao perceberem que em breve pisariam em terra firme, extasiaram-se de alegria. Mesmo maltrapilhos cada um escolheu um presente para entregar aos habitantes daquele lugar (possivelmente em troca de água e comida).
Na comunidade de Ubiraci havia uma profecia religiosa, aliás, não só na comunidade dele, mas como em algumas outras dezenas de grupos que habitavam aquele espaço de praias e florestas. Sinteticamente a profecia dizia que, em tempos difíceis, o deus Sol viria ao encontro das comunidades e as uniria novamente, pois, este seria o retorno ao princípio de tudo. Ao contrário disso, naquele tempo o que existia eram grandes rivalidades entre a maioria das comunidades, muitos já haviam morrido nestes conflitos e a cada ano as tempestades vinham aumentando, o que era identificado como castigo pela desunião das comunidades.
Os tripulantes tinham um desejo: levar a glória de Deus, criador dos céus e da terra, a todos os lugares. Eles criam que sua fé era a única possível, a verdadeira. Sua missão era fazer com que todo ser vivente acreditasse em um único Deus, o seu Deus.
Já era fim de tarde quando Ubiraci e seus companheiros receberam aquela visita inesperada. Era homens com os corpos demasiadamente cobertos, a pele clara, muito clara, clara como o sol. Tinham tantos utensílios e com tantas funções que pareciam criações de algum ser divino. Pedro e os tripulantes por sua vez, assustaram-se com tamanha depravação naquele ambiente: homens, mulheres e crianças quase em sua totalidade nus ou com apenas pequenos apetrechos cobrindo “as partes”. Não tinham nenhuma riqueza (não havia sinal de ouro e prata). Com efeito, aqueles seres não conheciam a Deus.
Ubiraci, chefe da comunidade e guerreiro respeitado até em outros grupos, não conseguiu falar com aqueles visitantes; eles tinham uma língua estranha. Ainda assim fizeram festa, acreditavam ser o deus Sol e seus auxiliares que tinham vindo unir as comunidades. Todavia, o que parecia ser a solução daqueles tempos difíceis não se concretizou. Após o primeiro contato, o deus Sol e seus companheiros já não tinham tanta graça: impuseram-lhes trabalho forçado, não compreendiam seus costumes, queriam ensinar-lhes outra língua, não aceitavam sua religiosidade. Algumas comunidades nunca aceitaram aqueles seres de pele clara, outras passaram a resistir, mas nunca mais conseguiram isolarem-se umas das outras, mesmo que talvez nunca tenham respondido: quem é o Outro?

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sábado, 3 de novembro de 2012

Igrejas de Évora... [Igreja do Salvador]


Na antiga Praça do Peixe (hoje Praça do Sertório), fica a antiga igreja do Convento do Salvador. Na mesma praça situa-se o edifício sede da Câmara Municipal de Évora. Do convento atualmente só restou parte do claustro. O início da obra data de 1595 e sua inauguração de 1616. A capela faz parte de um conjunto igrejas eborenses construídas no espírito da Contrarreforma, reestruturando o espaço sagrado, constituída de nave única. É uma igreja típica de freiras, numa época de crescimentos de ordens religiosas e consequentemente construção de conventos. A capela do Salvador é um típico exemplar arquitetônico dos Seiscentos, com aparência exterior austera, de paredes grossas e altas e aberturas reduzidas que contrasta com a máxima opulência do interior, característica do barroco. 






Mais informações: IGESPAR, Monumentos
A Reutilização Cultural da igreja do Salvador, em Évora – uma proposta, de Estela Cameirão, 2007.

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