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sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Na Pegada dos Africanos...: considerações acerca de Nina Rodrigues e sua obra Os africanos no Brasil

Já faz algum tempo que escuto falar de Nina Rodrigues (1862-1906) e seu racismo científico, porém nunca havia me debruçado sobre o que ele mesmo havia escrito em seu tempo, ou seja, fim do século XIX e início do século XX. Situando-o no contexto de sua época, Nina Rodrigues começou seus estudos enquanto o Brasil ainda vivia sob um regime escravista e teve sua carreira de médico legal e legista já nos anos em que a escravidão tinha sido abolida no país. No período em que ele ingressou na vida acadêmica, estavam em voga na Europa diversas teorias raciais e racistas, cujas bases eram fundamentadas na ciência, principalmente na biologia e na craniometria. Nina Rodrigues fora leitor destas teorias, bem como de Spencer que se apropriou da teoria evolucionista de Darwin e aplicou-a a sociedade e os sujeitos humanos.


Para além das questões discutidas na Europa acerca das teorias raciais, as elites brasileiras estavam discutindo em solo brasileiro a identidade nacional. Desde a subida ao trono de D. Pedro II foram realizados diversos trabalhos a fim de descobrir o que era o Brasil e quem eram os brasileiros. Exemplo disso tem a criação do Instituto Histórico e Geográfico Nacional, que foi responsável por reunir em todo o país memórias e aspectos geográficos de todas as províncias, e o concurso para escrever a primeira História do Brasil, onde Von Martius já no edital elegeu quais eram as matrizes da constituição do povo brasileiro: o branco, o negro e o índio. 

Se tratando de um período de transição, sempre há preocupações sobre a ocupação dos lugares sociais, esta é uma discussão feita por Wissembach que aborda em seu texto as dimensões de uma privacidade possível na passagem da escravidão à liberdade, a autora expõe argumentos de que os libertos após o 13 de maio pouco tempo passavam em suas casas devido a experiência vivida durante o tempo da escravidão, onde maior parte do tempo estavam trabalhando, o lugar de moradia na maioria das vezes sempre foi coletivo, o caso mais exemplar, a senzala. Assim nos primeiros anos após a abolição, por diversos fatores, o local de maior convívio entre os negros foram às ruas, um dos motivos mais citados pela autora é questão da insalubridade das casas, a definição de bairros periféricos e no momento da abolição, a maioria dos escravos deixaram seus senhores, fazendas e engenhos para irem viver nas cidades, o que causou um inchaço demográfico nas principais cidades do país: Rio de Janeiro, São Paulo, São Luís, Recife e Salvador; e no caso da Bahia ainda podemos citar Cachoeira, Santo Amaro e Feira de Santana, deste modo, cidade que já não tinham crescimento planejado, que já vinham em processo de crescimento desordenado, posto que a maioria dos alforriados acabavam indo morar nas cidades mais próximas, no momento do fim da escravidão a maior parte dos ex-cativos se aglomeraram nos centros urbanos. Portanto, nesse meio onde havia uma grande discussão acerca da raça como elemento definidor do indivíduo enquanto sujeito, sobretudo na Europa e da construção de um país chamado Brasil e que agora tinha que por definitivamente os negros como elemento social, é que Nina Rodrigues se tornará um dos mais respeitados cientistas raciais de sua época. 

A obra de Nina Rodrigues Os Africanos no Brasil que foi publicada postumamente em 1932, entretanto fora escrita entre 1890 e 1905. Este livro contém informações da maneira como viviam os africanos na Bahia. Uma das razões para que Salvador tivesse grande quantidade ainda de negros africanos na época em que Nina escreveu seu texto se deve a grande mobilidade, já mencionada, para as cidades após o 13 de maio, posto que de um modo geral os escravos em sua maioria acreditavam que enfim teriam acesso ao que sempre lhes fora negado, a posse da terra, contudo não foi isso que aconteceu e relegados a viverem a margem da sociedade rural e muitas vezes não querendo viver na fazenda onde tinha sido escravo iam em direção às cidades, ou seja, o luar de destino das produções das fazendas. Outro fato importante é a questão da família, muitos ex-escravos saíam em busca de seus familiares a fim de reconstituírem suas famílias, aspecto também trabalhado por Walter Fraga que através da análise da trajetória de escravos em Salvador e parte do Recôncavo baiano antes e após abolição, demonstra que estes em sua maioria migraram para lugares onde possuíam familiares ou ainda lugares onde poderiam viver longe das lembranças da escravidão. 


Partindo disso, Wissembach ao falar das péssimas condições de moradia nas cidades, ela mostra que a vida coletiva após a Lei Áurea sempre esteve presente na vida da maioria dos ex-cativos, pois além de passarem a maior parte do tempo nas ruas trabalhando, ou como vadios, nos momentos que estavam em seus ambientes particulares, dividiam quintais, tanques para lavar roupa, quando não iam lavar nos rios, etc. Outro elemento abordado por Walter Fraga, é que encontramos muitos ex-cativos nas greves operárias do início da República, ou seja, as experiências e o cotidiano da senzala não sumiram com a Abolição como às vezes a historiografia parece demonstrar, os trabalhadores livres do início da República são oriundos em sua maioria das senzalas da escravidão do fim do século XIX, que vale ressaltar, época em que a campanha abolicionista ganhou mais vigor e adeptos, e que nas fábricas continuaram lutaram por melhores condições de trabalho, moradia e lutando pelo acesso a uma vida digna que a lei Áurea pareceu ser a possibilidade concreta disso, mas logo muitos perceberam que a cidadania almejada ainda estava longe de ser conquistada. E é longe dessas discussões de nosso século acerca da cidadania e presença dos africanos no início da República que Os africanos no Brasil se insere, uma tentativa do autor de elencar e estabelecer as principais características dos diferentes povos negros que foram trazidos à Bahia durante o período escravista. É de admirável constatação que temos um autor contemporâneo aos grandes debates sobre raça, estivesse preocupado com os africanos, os que ainda restavam na Bahia como ele mesmo atesta em seu texto. 

Apesar do cunho racista, presente em todo o texto de Os Africanos no Brasil, pode-se destacar a capacidade e a sensibilidade do intelectual Nina Rodrigues em ser original e proporcionar para aquela época formas de estudo científico até então pouco utilizadas no Brasil. O autor de Os Africanos no Brasil em muitas ocasiões conviveu com as diversas etnias africanas que ainda residiam em Salvador, realizando assim uma pesquisa etnográfica e descortinando algumas características do processo de tráfico desde os portos da África até o Brasil, bem como quais foram os principais destinos dos africanos ao aportarem em terras brasileiras. Dentre outras coisas também, o autor elabora um extenso percurso das práticas culturais dos africanos que se tornaram presentes no cotidiano da população brasileira (lembrando que o estudo que Nina Rodrigues fez foi especialmente em Salvador), seja nas práticas culinárias, musicais, religiosas, etc. 

O livro Os africanos no Brasil dividido em seis capítulos, pode ser lido da seguinte forma: nos três primeiros capítulos o autor faz um percurso histórico das origens e permanências dos africanos no Brasil, discutindo inclusive características de cada etnia e mostrando também de que maneira se deram as revoltas durante o período colonial e, sobretudo na primeira metade do século XIX. Nina Rodrigues chama atenção para o descaso dos pesquisadores brasileiros em negligenciar o quanto a presença dos africanos está contida no que podemos chamar hoje de “brasileiridade”, ou seja, os brasileiros foram e muito influenciados pelos africanos depois de mais de três séculos de intenso tráfico. Ainda nessa primeira parte ele traz importantes dados como no início do século XX, a quantidade de negros residindo no Brasil já havia decrescido consideravelmente. Nos últimos três capítulos, Nina Rodrigues traz uma série de constatações do quanto a Bahia era negra, isto é, por mais que se falasse em branqueamento da população, era impossível negar a presença do sangue negro nos baianos, mesmo nas camadas mais abastadas da população. Discutindo esta presença dos africanos, o autor traça um percurso que começa com os últimos africanos que ainda moravam na cidade do Salvador e depois traz de forma sistemática as contribuições da língua, das belas-artes, das festas populares, do folclore e também do que entendemos hoje como religião africana, mas que na época em que ele escreveu era entendida como manifestações animistas. 


Sobre a presença dos os últimos africanos na Bahia, devemos considerar os estudos de Reginaldo que discorre da invisibilidade aos bantos dados por Nina Rodrigues em sua composição demográfica dos africanos residentes na Bahia. O texto da autora salienta que durante o tráfico de escravos, a maior parte vinha da África centro-austral, isto é, da região do Congo-Angola onde tinham predominância da etnia banto. No entanto, o texto de Os africanos no Brasil, traz o elemento sudanês iorubá como o principal formador das etnias africanas no Brasil. Reginaldo elenca uma série de proposições calcadas nas em uma das vertentes das teorias raciais em que provavelmente Nina Rodrigues tenha se apoiado para negligenciar o elemento banto. Segundo ela, isto se deve a hierarquização das raças, ou seja, ainda sendo a raça negra inferior, dentro dela haveria uma hierarquia e os sudaneses estariam no topo, enquanto os bantos seriam a aberração da raça. Assim, para a autora, instruído nessas idéias Nina Rodrigues hipervaloriza os nagôs (como eram chamados os oriundos dos Reinos de Oyó), o que consiste em uma saída “criativa” para dizer que se no Brasil o elemento africanos é inegavelmente formador do povo, pelo menos ele provém do melhor subgrupo. 

Ao refletir sobre a produção de Nina Rodrigues, podemos perceber o quanto ele abriu possibilidades para entender a presença dos africanos no Brasil. Seu estudo etnográfico e também de uso de fontes muito comum a historiadores, como censos, processos crime e também inovadoras como relatos orais, pesquisa lingüística foi precedente às muitas pesquisas que ainda hoje estão sendo produzidas sobre aqueles que vieram através do tráfico de escravos do continente africanos até o Brasil. Situá-lo como simplesmente um cientista racista pode ser um tanto quanto reducionista, de fato ele o foi, porém é necessário que esteja em mente que os homens são frutos de seu tempo, e como já foi pontuado em linhas anteriores, a transição do século XIX para o século XX no Brasil (período de estudo e produção de Nina Rodrigues) foi marcada pela tentativa de construção da identidade nacional, e segundo as elites ela não poderia ter origem escrava, sendo assim, em consonância com as teorias raciais vigente na Europa produziu discursos acerca da inferiorização dos africanos e, sobretudo dos mestiços. 

Destarte, ao ler Os africanos no Brasil é possível realizar uma viagem no tempo e apreender como não Nina Rodrigues entendia a presença dos africanos em solo tupiniquim, mas também uma série de pensadores e intelectuais que assim como o autor em questão viam de maneira negativa o elemento negro misturado ao branco. É possível pensar assim a partir da leitura de Swcharcz, que traça um panorama de como estas teorias raciais ganham força no Brasil no fim do século XIX e também em outros textos como o de Azevedo que através de um conjunto de fontes impressas e documentais discute como a presença dos africanos e mestiços incomodava as elites, inclusive o medo de que no Brasil pudesse ocorrer um movimento semelhante ao do Haiti, onde mais de quatrocentos mil escravos se sublevaram e tomaram o poder da ilha declarando-se independentes da França ainda no século XVIII. Portanto, nesse jogo de perceber a presença dos africanos, suas contribuições para a cultura brasileira e também em consonância com as teorias científico-raciais que inferiorizavam os negros e os punha em situação de quase animais, que Nina Rodrigues escreve seu livro, preocupado com essa presença negra e teorizando a partir dos conhecimentos de sua época. 

REFERÊNCIAS:

AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Onda negra, medo branco: o negro no imaginário das elites, século XIX. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
FRAGA FILHO, Walter. Encruzilhadas da liberdade: histórias de escravos e libertos na Bahia, 1870-1910. Campinas, SP: Ed. UNICAMP, 2006.
REGINALDO, Lucilene. “Uns três congos e alguns angolas”: ou outros africanos da Bahia. História Unisinos. set/dez 2010 .
RODRIGUES, Nina. Os africanos no Brasil. São Paulo: Ed. Nacional, [Brasília]: Ed. Universidade de Brasília, 1982.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil, 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
WISSEMBACH, Maria Cristina Cortez. Da escravidão à liberdade: dimensões de uma vida possível. In: História da Vida Privada no Brasil. São Paulo: Cia. das Letras, vol. 3.

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terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Comentários sobre a Revolução Industrial... [2]

A Revolução Industrial foi um dos fenômenos que mais tiveram importância no que concerne à configuração de como as sociedades em geral travavam suas relações econômicas, sociais e políticas. Porém, um processo transformador como este não surgiu de uma só vez em todo o globo, a Revolução Industrial teve suas origens em meados do século XVIII na Inglaterra, sobretudo através da maquinofatura têxtil. Eric Hobsbawm em sua obra A Era das Revoluções ressalta dentre outras características, a defesa de que as transformações ocorridas na Inglaterra de fato foram uma revolução, para isto ele recorre a aspectos quantitativos na produção inglesa a partir da introdução da máquina de tear a vapor e também aspectos qualitativos como a alteração nas sensibilidades e sociabilidades da sociedade inglesa a partir do surgimento da grande indústria.




É importante, ao analisar qualquer fato no passado discutir seu contexto, pois o historiador é por natureza um criador de contextos, na medida em que verticaliza sua análise, coloca em contextualização com o que a cerca e assim sendo, Hobsbawm dispões elementos ao leitor para que perceba em que conformidade das coisas ocorreu a Revolução Industrial na Inglaterra. No contexto externo, o autor afirma ser a França muito mais bem dotada no nível educacional e por sua vez, Alemanha e Bélgica possuidoras de mais tecnologias industriais que a Inglaterra, ainda poderia ser acrescentada nesse rol a Holanda, expoente comercial nesse período. Isso mostra como a Inglaterra tinha menos desenvolvimento em alguns aspectos comparados a outras nações da Europa, contudo havia ocorrido grande acumulação de capitais, principalmente após o período da Revolução política Inglesa, em que a burguesia constitucionalizou a monarquia gerando assim uma monarquia parlamentarista na Inglaterra ainda no século XVII, deste modo foi possível que a burguesia aparelhasse o Estado inglês em seu favor, favorecendo a propriedade privada, a exemplo dos cercamentos. Além disso, o Estado inglês também acumulou muito capital através dos corsários no Atlântico e também, por meio de empréstimos e tratados comerciais com outras nações, por exemplo, o Tratado de Methuen com Portugal.

Com o aumento das reservas de capital tanto individual quanto estatal; a prática de cercamentos em que alterou marcadamente a forma de produzir e consequentemente beneficiou grandes produtores, ocasionando a saída dos pequenos camponeses para as cidades pela falta de trabalho no campo e o desenvolvimento das novas técnicas de fiar o algodão (principal produto de exportação inglês, ou seja, suas manufaturas) impulsionou um movimento de investimentos cada vez maior na indústria, que tinha bastante mão-de-obra vinda do campo e capital suficiente a utilizar.
Portanto, é nesse entrelaçamento de fatores que ocorre a Revolução Industrial para Hobsbawm, e para ilustrar as alterações sociais neste período é possível utilizar o capítulo XIII de O Capital intitulado “Maquinaria e Grande Indústria”. O autor desta, Karl Marx, é contemporâneo desta avalanche transformadora das relações de produção que é a grande indústria. Marx neste capítulo se detém em discutir como o modo de produção capitalista alterou não só as relações de trabalho, mas as relações com o tempo, as relações familiares, as relações com a natureza, etc., enfim o homem e o mundo já se conheciam e reconheciam de maneiras totalmente diferentes. Bem como Hobsbawm, Marx elenca aspectos quantitativos a respeito da produção, como a cada nova máquina mais moderna se passa a produzir mais e ao mesmo tempo ele vai mostrando a perda dos trabalhadores em salários e o aumento de desemprego, aumento da jornada de trabalho de sua intensidade. Também põe em destaque a condição de trabalho do proletariado: lugares insalubres, falta de segurança, etc.

                      

Marx discute o conceito de mais-valia, que é a exploração do homem pelo homem como fonte de riqueza e base de sustentação da economia capitalista, e segundo ele a indústria é o lugar por excelência que ocorre esta expropriação do homem, a grande indústria significa a consolidação do capital como estrutura econômica. Enfim, a Revolução Industrial além de consolidar o capitalismo, é um processo que desde quando se iniciou não mais parou, significando a apropriação da burguesia das relações de produção.

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sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Créditos de Saudade...

É mais ou menos assim: ela tem saudade de mim e eu sinto saudade dela.  De vez em quando eu dou uma olhada na janela para tentar encontrá-la. Eu não sei se ela tenta me achar...

Saudade há daquelas esperas...
Saudade há daquelas viagens...
Saudade há daquelas conversas...
Saudade há daquelas leituras...

Se o que me disseram for verdade: que “a saudade é nossa alma dizendo para onde ela quer voltar”; Eu quero retornar várias vezes para aquele olhar, para aquela voz, para aquele sorriso, para Aquele Abraço

Olhar que me encanta‼
Voz que me conforta‼
Sorriso que me alumia‼
Abraço que me envolve‼


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Você Conhece a Bahia?

Eis São Miguel das Matas:


A denominação do nome Vila de São Miguel da Aldeia está ligado à visita de um “caboclo” que passara pela região pedindo ajuda para festejar o Santo São Miguel Arcanjo, na Vila de Jaguaripe.


Área: 207.446 km²
Distância até a capital: 225 km

População: 10 414 hab. IBGE/2010
Densidade: 50,2 hab./km²



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